“Está tudo bem, senhor Doutor!”

Entrou no consultório com um sorriso de orelha a orelha. Roupa impecável. Olhar comprometido. Gracejar estudado, mas pouco convincente, como se estivesse a querer apenas fazer tempo e sair dali depressa. 

Depois de uma breve conversa, observei aquele paciente com todo o cuidado. Exames, análises e histórico clínico vistos ao pormenor ditaram o diagnóstico sincero: “Está com um problema cardíaco e parece grave. Precisa de ir ao cardiologista com urgência”

“Problema? Eu? Não...” – disse. “Mas não sente uma dor no peito? Não tem problemas respiratórios frequentes?” – perguntei. A resposta foi desconcertante: “Isso não é grave. Não tive nenhum ataque cardíaco.” Ainda sem acreditar no que ouvia, reformulei: “Mas se os seus exames apontam para um problema no coração... já pensou que pode estar a por em perigo a sua vida?” E o discurso não mudou: “Não... Comigo? Nunca! Está tudo bem, senhor Doutor!”

O pior doente é aquele que, mesmo a morrer, nega o diagnóstico. Prefere apodrecer na sua teimosia a enfrentar o bloco operatório, a dieta, a medicação... e pior do que isto, é quando o médico é Deus e a doença são os nossos pecados.

O Médico dos Médicos, que cura o corpo, quer antes de tudo curar a alma de cada homem, de cada mulher. Deus conhece-nos profundamente. Afinal, Ele criou-nos e sabe que estilo de vida moral, físico e psicológico é mais saudável para nós.

Quando entramos no Seu consultório, tenhamos o bom senso de escutar o Seu diagnóstico, fazer a dieta necessária, tomar a medicação correcta. Há problemas que só Ele consegue resolver com o toque cirúrgico da Sua Palavra, que mesmo quando nos fere é para operar mudança e crescimento, para nos aperfeiçoar em amor.

Se desejamos viver à nossa maneira e rasgamos na prática a receita médica, evitando aplicar à nossa vida a Palavra de Deus, achamo-nos acima de tudo e de todos, perfeitamente intocáveis, como se fossemos detentores de toda a verdade. Qual será o nosso destino? 

Caminhamos para a decadência ao fazermos uma auto-medicação moral e espiritual ajustada às nossas conveniências, ou permitimos que o diagnóstico amoroso de Deus nos confronte para nos dar vida? 

Ao pensar no tema, um jovem universitário afirmou “Assumir a doença é o mesmo que dizer que precisamos de ajuda.... Numa sociedade auto-suficiente a dependência é impensável!” (Eliézer Correia). O facto é que esta independência é tão ou mais perigosa que renegarmos a ajuda dos médicos, quando o problema é a nossa saúde. Precisamos dos outros. Precisamos de Deus.

Em vez de vivermos orgulhosamente sós, numa falsa independência, numa concretização efémera, entretidos com a sedução do erro camuflado, talvez tenhamos que nos render e arrepender de estarmos a levar um estilo de vida que renega o plano de saúde total de Deus para o homem.

O arrependimento é um acto de coragem num mundo que se esmera por viver ilusoriamente emancipado. É mudar de direcção assumidamente e estabelecer um compromisso de seguir Cristo, aconteça o que acontecer. 

“Mas Jesus, que os ouvira, respondeu: Porque não são os que têm saúde que precisam de médico, são os doentes. Têm de aprender o que significa esta passagem das Escrituras: Mais do que os vossos sacrifícios, quero provas da vossa bondade. Eu vim a este mundo para chamar os pecadores para que se voltem para Deus. Não vim para os que já se consideram a si próprios bons.” (Mateus 9:12-13, versão “O Livro”)

Ana Ramalho


in revista Novas de Alegria, Setembro 2010

Comentários